Direito Trabalhista
Seção 6
Sua causa!
Olá! Seja bem-vindo à Seção 6 do NPJ de Direito do Trabalho.
Durante todo o desenvolvimento do caso proposto, você alternou a representação processual, ora sendo advogado do reclamante, João da Silva, ora sendo patrono da reclamada, XYZ TECNOLOGIA S.A. Essa inversão dos papéis ocorreu apenas para fins didáticos, a fim de que você tenha contato com o maior número de peças processuais possível, tornando-o um profissional mais qualificado.
Até o momento, houve o julgamento pela 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, que decidiu pela procedência total dos pedidos formulados pelo reclamante. Diante de tal decisão, a reclamada interpôs Recurso Ordinário na tentativa de reverter a decisão de primeiro grau junto ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Foram, por fim, apresentadas contrarrazões.
Agora, noticiaremos o desfecho desta reclamação trabalhista. O TRT da 3ª Região manteve integralmente a sentença, tendo o processo transitado em julgado. Os autos, então, foram remetidos para a 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, oportunidade em que João da Silva requereu o início da fase de liquidação, com fundamento no art. 879 da CLT. Foram apresentados cálculos pelas partes, tendo o reclamante concordado com o valor de R$ XXXX apurado pela Executada. Ela foi intimada a realizar o pagamento da quantia devida, nos termos do art. 880 da CLT, mas não o efetuou. Em seguida, tentou-se bloqueio das contas bancárias da devedora, assim como de diversos outros bens, sem qualquer sucesso.
A notícia que “corre” é que a empresa encerrou suas atividades.
Diante deste cenário, foi instaurado Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, previsto no art. 855-A da CLT. Foi julgado procedente, e a execução foi redirecionada para a sócia administradora, Sra. Maria Antonieta Bueno. Entretanto, a execução também restou frustrada em relação a ela.
Seu cliente, João da Silva, entrega-lhe diversos prints de redes sociais, em que a Sra. Maria Antonieta narra como consegue viajar constantemente sem gastar muito dinheiro. Ela informa que o “segredo” é a utilização das milhas ou dos pontos dos cartões de crédito que possui, e ensina como comercializar as milhas e os pontos antes que eles expirem. Todos os prints estão devidamente autenticados de forma eletrônica, de forma a garantir sua integridade, autenticidade e a higidez da cadeia de custódia.
Diante deste cenário, foi requerida, perante a 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, a penhora das milhas e dos pontos dos programas de fidelidade dos cartões de crédito em nome de Maria Antonieta Bueno. Foi prolatada sentença, negando a penhora, sob o seguinte fundamento:
Considerando que não existem mecanismos seguros e amplamente aceitos para realizar a conversão das milhas em dinheiro, indefiro o requerimento.
Notifique-se o exequente para requerer outras medidas executórias de forma fundamentada e determinada no prazo de 10 dias, sob pena de arquivamento provisório
O Exequente João da Silva está indignado com a decisão judicial. Ele alega que existe comércio de milhas realizado por diversas empresas, o que demonstra a existência de caráter econômico.
Ante a circunstância exposta, ele lhe pede que avalie se existe algum recurso cabível para tentar reverter a decisão. Caso exista, solicita que seja imediatamente interposto.
A sentença que indeferiu o pedido de penhora das milhas e pontos foi publicada em 11/06/2024.
Fundamentando!
Você precisa analisar a medida judicial que é cabível contra a decisão proferida pela 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG. Talvez, esta seja a última oportunidade de João da Silva receber o valor que lhe é devido em decorrência da reclamação trabalhista.
Passa-se, então, à análise das questões jurídicas necessárias para a elaboração da peça processual apta a defender os interesses de João.
1 – PEÇA PROCESSUAL
O processo se encontra na fase de execução definitiva, já tendo ocorrido, portanto, o trânsito em julgado.
Em sede de execução, já se esgotaram as possibilidades de recebimento do crédito junto à executada principal, a empresa XYZ TECNOLOGIA S.A. Houve a desconsideração da personalidade jurídica, voltando-se a presente execução contra a Sra. Maria Antonieta Bueno. Ocorre que não foram encontrados valores em suas contas bancárias, muito menos bens em seu nome.
Foram implementadas todas as medidas possíveis para a constrição de patrimônio do devedor, sem qualquer sucesso. Por este motivo, foi requerida a penhora de milhas e pontos de fidelidade nos cartões de crédito da Sra. Maria, com fundamento no art. art. 139, inciso IV, do CPC.
Como salientado, a 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte proferiu sentença indeferindo a pretensão. Nos termos do art. 897 da CLT, é possível a interposição de recurso para que a matéria seja levada à apreciação o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.
Neste momento processual, a discussão cinge-se à possibilidade jurídica ou não da penhora requerida.
2 – MEDIDAS ATÍPICAS NA EXECUÇÃO – PENHORA DE MILHAS E PONTOS DE PROGRAMA DE FIDELIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO
A execução é um procedimento judicial de constrição do patrimônio do devedor, quando a dívida não é tempestiva e espontaneamente quitada.
O art. 880 da CLT prevê o prazo de 48 (quarenta e oito) horas para fins de pagamento do valor devido ou indicação de bens à penhora. Neste caso, prevalece a ordem legal prevista no art. 835 do CPC, por força da aplicação supletiva e subsidiária do Direito Processual Civil ao Direito Processual do Trabalho (art. 15 do CPC e art. 769 da CLT).
Na situação sob exame, não foram encontrados bens passíveis de penhora tanto no patrimônio da executada quanto de sua sócia. A derradeira tentativa de satisfação do crédito se deu por meio da penhora de milhas e pontos de programa de fidelidade do cartão de crédito da Sra. Maria Antonieta. O pedido foi lastreado no art. 139, inciso IV, do CPC, que assim prevê:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
(…)
IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou subrogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; (Brasil, 2015, [s. p.])
A decisão judicial sequer analisou a questão sob a ótica do invocado art. 139, limitando-se a aduzir que não existem mecanismos seguros para realizar a conversão de milhas em dinheiro.
Contudo, trata-se de fato público e notório que as milhas e pontuações de programas de cartão de crédito têm valor econômico, o que afasta a disposição contida na sentença proferida pela 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG na fase de execução.
As medidas alternativas coercitivas para assegurar o cumprimento da decisão judicial foram objeto de recente análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão preferida em 09/02/2023. Ela assegurou constitucionalidade da invocada previsão do CPC. A decisão aduz que não podem ser violados os direitos fundamentais do devedor e deve-se observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Sugere-se a leitura da notícia veiculada no site do STF, que muito bem resume esta importante decisão. Seu acesso pode ser feito pelo seguinte link:
https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=502102
Para uma compreensão mais específica sobre a temática que envolve a penhora de milhas e/ou pontos de programa de fidelidade de cartão de crédito, sugere-se a leitura do acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, nos autos do processo nº 0000167- 71.2017.506.0020, publicada no DEJT em 25/02/2022, cujo acesso pode ser feito no seguinte link:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-6/1431438799/inteiro-teor-1431438926
Quadro 1 | Quadro sinótico da legislação e jurisprudência consolidada aplicável
(referidos e não referidos nas explicações anteriores)
Fonte: elaborado pelo autor.
Vamos peticionar!
Chegou a hora de você demonstrar que é um advogado atualizado e ciente de todas as medidas processuais cabíveis que podem ser tomadas em defesa dos interesses do seu cliente.
Você deve aproveitar o momento processual para utilizar todos os argumentos possíveis para convencer o TRT da 3ª Região a reformar a decisão prolatada pela 48ª do Trabalho de Belo Horizonte/MG, autorizando a penhora de milhas e pontos do programa de fidelidade do cartão de crédito de Maria Antonieta Bueno.
Como em qualquer outro recurso, a peça processual a ser elaborada deve ser endereçada ao juízo que prolatou a decisão, que realizará o primeiro juízo de admissibilidade.
Tendo em vista que a tempestividade é um dos requisitos do recurso, é necessário, para fins didáticos, que a peça processual tenha tópico relativo a ela, a fim de demonstrar que o apelo foi interposto no momento adequado.
Vamos lá?