Direito Constitucional
Seção 3
Sua causa!
Querido estudante!
Seja bem-vindo ao nosso terceiro encontro do Núcleo de Prática Jurídica com suporte em AVA de Direito Constitucional.
Relembraremos o nosso problema, veremos qual o nosso novo desafio e aprenderemos mais sobre Direito Constitucional e as suas conexões com outras disciplinas que são importantíssimas na nossa vida cotidiana.
O CASO
Luiz é advogado em São Paulo e atua na defesa de consumidores com problemas de superendividamento. Ele recebeu em seu escritório a Fernanda, uma funcionária pública municipal, que recebe vencimentos de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por mês, mas está repleta de dívidas com empresas de cartão de crédito e bancos, além de já ter perdido o seu veículo, o apartamento em que vive e o seu plano de saúde.
Por ter enfrentado algumas dificuldades nos últimos anos, Fernanda passou a não quitar as faturas de seus cartões de crédito, levando ao constante parcelamento e pagamento do mínimo previsto, o chamado crédito rotativo do cartão de crédito. Após um ano, ela viu que as contas do cartão superavam em muito o valor de seu salário e pegou um empréstimo consignado para realizar a sua quitação. Contudo, o valor do empréstimo impossibilitou-a de realizar outros pagamentos, devendo se valer de novos empréstimos consignados para pagamento das dívidas anteriores e se manter.
Nesse tempo, vendeu o seu carro e comprou outro financiado, para com o valor da venda pagar alguns dos empréstimos. No entanto, não conseguiu pagar as parcelas e teve que entregar o carro para leilão, tendo perdido o valor de entrada e, ainda, permanecido com a nova dívida referente ao veículo.
Fernanda tentou realizar uma conciliação com os devedores em uma feira que estava ocorrendo junto a uma empresa de proteção de crédito, mas não houve acordo, uma vez que os parcelamentos oferecidos comprometiam integralmente o seu salário. O mesmo ocorreu em uma tentativa de conciliação perante o Procon da capital de São Paulo. Ela levou ao escritório todos os documentos comprobatórios dessas tentativas de acordo.
As dívidas de Fernanda estão concentradas em três instituições financeiras: Banco Itubank (R$ 700.000,00), Banco Nesco (R$ 300.000,00) e Financeira Boa Grana (R$ 100.000,00).
Fernanda não possui mais nenhum bem em seu nome e vive de favor na casa de uma amiga de família.
Com isso em vista e figurando como o advogado Luiz, você ingressou com a ação de superendividamento em face das credoras de Fernanda.
A sua ação foi recebida na 7ª Vara Cível de São Paulo, e pelo juiz da causa foi ordenada a citação das partes passivas com a ordem de apresentação de todos os documentos, em especial, os contratos de empréstimo firmados entre Fernanda e os credores, como foi requerido na inicial.
Inconformado com a ordem de apresentação dos documentos referidos, o Banco Nesco interpôs Agravo de Instrumento contra essa decisão, alegando ser ônus da parte autora a apresentação de tais documentos, não devendo ser a ele imputada essa obrigação sob pena de ferimento ao princípio do contraditório e da ampla defesa.
Você elaborou uma Contraminuta de Agravo de Instrumento perante a 11ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo e manteve a decisão de primeiro grau com a obrigação de apresentação dos documentos e contratos referentes aos empréstimos.
Com essa informação nos autos, o magistrado designou uma audiência de conciliação, mas determinou que, antes, a autora Fernanda depositasse as custas iniciais do processo, no valor de R$ 11.000,00 (onze mil reais), no prazo de dez dias, em face da impossibilidade de concessão de assistência judicial gratuita diante dos comprovantes de seus rendimentos mensais de R$ 10.000,00 (dez mil reais) como funcionária pública municipal, sob pena de extinção do processo sem julgamento do mérito.
Luiz peticionou pedindo a reconsideração da decisão em razão da impossibilidade de a autora arcas com os custos do processo diante da condição de hipossuficiência financeira que a impede de arcar com as despesas do processo sem o comprometimento da manutenção de patrimônio mínimo, efetivamente demonstrado nos autos e objeto da própria razão de ser da ação proposta. Contudo, o juiz manteve integralmente a sua decisão sem maior fundamentação.
Qual providência processual deverá tomar o advogado Luiz? Apresente a peça processual adequada com os fundamentos jurídicos necessários.
Aprenderemos algumas coisas que auxiliarão nessa missão que começa agora.
Fundamentando!
A CONSTITUIÇÃO E OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO PROCESSO
Os princípios fundamentais do processo civil encontram sua base na Constituição Federal e constituem direitos e garantias fundamentais protegidas como cláusulas pétreas (art. 60, §4º).
O art. 1º do Código de Processo Civil expressamente aponta para a sujeição do processo civil aos preceitos da norma superior. O teor desse artigo ressalta a exigência de que o processo seja “ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição, observando-se as disposições neste código (…)” (Brasil, 2015, [s. p.]).
Além disso, essa disposição inicial desempenha a função de orientar e esclarecer aqueles que buscam uma aplicação precisa dos princípios processuais. Sua inclusão no início do guia do procedimento legal não é acidental, mas, sim, direcionada a servir como um ponto de referência interpretativa. Nesse sentido, compreender as normas fundamentais presentes na Constituição Federal é de vital importância para uma aplicação adequada dos princípios processuais.
Sendo assim, para que haja maior interpretação, esboça-se, a seguir, os principais princípios fundamentais do processo civil, assim como onde eles podem ser encontrados na Constituição Federal.
DEVIDO PROCESSO LEGAL – Art. 5º, LIV
Garante que os indivíduos não sejam privados de seus bens ou liberdade sem a devida observância da lei e das proteções legais inerentes ao processo.
O devido processo legal é um sobreprincípio, isto é, ele incorpora em sua concepção diversos outros princípios, como o direito de resposta (inciso V); a inviolabilidade do domicílio (inciso XI); a vedação de juízo ou tribunal de exceção (incisos XXXVII e LIII); a vedação da prova obtida por meios ilícitos (inciso LVI); a presunção de inocência (LVII); a assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (inciso LXXIV); a duração razoável dos processos (inciso LXXVIII); entre outros1 .
Sua origem histórica remonta à Inglaterra no ano de 1215, em sua previsão na Magna Charta Libertatis.
ACESSO À JUSTIÇA – Art. 5º, XXXV
É vedado pela lei eliminar a possibilidade de o Judiciário avaliar qualquer prejudicialidade ou possibilidade de prejudicialidade aos direitos. Ademais, é incumbência do sistema judiciário reagir a todas as solicitações direcionadas a ele (abrangendo a noção ampla de ações legais). Em outras palavras, foi dado ao Poder Judiciário a função constitucional de dar a última palavra na análise da legalidade e constitucionalidade dos atos jurídicos, não podendo a lei ou a própria Constituição, por meio de emenda, vedar esse controle.
CONTRADITÓRIO – Art. 5º, LV
Todos os envolvidos no processo, as partes e terceiros, devem ter ciência e possibilidade de intervir sobre todos os eventos que transcorrem durante ele, concedendo-lhes a chance de expressar suas opiniões e se opor às solicitações da parte adversa.
DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO – Art. 5º, LXXVIII
Este princípio é direcionado tanto ao legislador quanto ao juiz. Ao legislador, é recomendado que, ao criar leis processuais, se assegure de que o processo alcance sua conclusão desejada no menor período e com eficiência em termos de esforço e despesas. Ao juiz, é solicitado que conduza o processo de maneira ágil e eficaz.
Segundo o texto constitucional, “LXXVIII – A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (Brasil, 1988, [s. p.]).
Esse princípio, denominado também de celeridade processual, foi incluído expressamente pela Emenda Constitucional nº 45/2000.
1 MANCUSO, R. de C. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 86-87.
ISONOMIA – Art. 5º, caput e inciso I
Igualmente voltada para o legislador e o juiz, esta demanda que tanto a lei quanto o sistema judiciário tratem de maneira equitativa aqueles que são semelhantes e de maneira diferenciada aqueles que apresentam diferenças substanciais, respeitando o grau de desigualdade existente (princípio da justiça proporcional).
IMPARCIALIDADE DO JUIZ – Art. 5º, LIII e XXXVII
Para cada situação legal, um juiz inerente é designado, selecionado conforme as normas já estabelecidas no sistema jurídico. Devido a essa base, é proibida a formação de tribunais ou juízes especiais para casos excepcionais.
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO – Não há previsão expressa
Mesmo que não seja explicitamente estipulado, surge de forma implícita a partir da adoção, pela Constituição Federal, de um sistema composto por instâncias judiciais e cortes superiores que revisam vereditos de instâncias inferiores. Contudo, em determinados contextos, não é impedido que a existência de um segundo nível de julgamento esteja ausente.
Trata-se de um princípio constitucional implícito, isto é, não escrito, mas que decorre da lógica constitucional.
PUBLICIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS – Art. 5º, LX, que atribui à lei a regulamentação dos casos de sigilo (art. 189 do CPC)
As ações realizadas no âmbito do processo são de conhecimento público, uma medida necessária para garantir a transparência das atividades judiciais. A Constituição atribui à legislação a tarefa de estabelecer regras para situações de confidencialidade, quando a proteção da privacidade ou o interesse coletivo ou público assim demandarem. Essa regulamentação foi incorporada no art. 189 do Código de Processo Civil.
MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES – Art. 93, IX
Igualmente para garantir a transparência nas operações judiciárias, é essencial que todas as determinações emanadas dos juízos ou tribunais sejam fundamentadas, permitindo, assim, que as partes envolvidas no litígio, as instâncias superiores e a sociedade em geral possam compreender a justificação por trás de cada resolução.
PONTO DE ATENÇÃO
DEVIDO PROCESSO LEGAL – Art. 5º, LIV
“LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;”
O devido processo legal é um sobreprincípio, isto é, ele incorpora em sua concepção
diversos outros princípios referentes a um processo justo.
Vamos peticionar!
Com esse conteúdo, estamos prontos para a prática!
Qual peça processual o Dr. Luiz deverá apresentar?
Ela deve ser proposta no foro competente.
Lembre-se de que temos que buscar solução para o problema de Fernanda junto aos órgãos financeiros de forma global e coletiva.
Qual é a peça cabível?
Feito isso, você deverá:
1) Verificar o foro competente para o seu julgamento, para fazer o correto endereçamento da peça.
2) Apresentar a devida fundamentação legal.
3) Narrar os fatos que embasam a demanda.
4) Fazer os requerimentos.
5) Datar e assinar a petição.
Agora é com você!
Mãos à obra!