Direito Civil
Seção 4
Sua causa!
Iniciaremos, agora, a nossa quarta seção, cujo objetivo é adotar as providências necessárias à defesa da parte prejudicada pelo julgamento desfavorável de Ação de Responsabilidade Civil por Danos Materiais e Morais, sendo o valor de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais) relativo aos danos materiais e R$ 5.000,00 (cinco mil reais) relativo aos danos morais, distribuída à 62ª Vara Cível de Serraville/RS, sob o nº 00008987-98.2023.4.5.0031, em face de Joana Bradiburgo Dumont.
O autor da ação, Flávio Dutra, alegou que, em 15 de março de 2023, enquanto dirigia seu veículo particular por uma rua movimentada da cidade, foi vítima de um acidente de trânsito causado por Joana Bradiburgo Dumont. Flávio descreveu que Joana estava dirigindo seu carro de forma negligente e, como resultado, colidiu violentamente com seu veículo, causando-lhe lesões físicas e graves danos morais.
Em sede de contestação Joana apontou que, ao contrário do alegado, em momento algum foi negligente, negando veementemente tal imposição, ao passo que o acidente ocorreu em circunstâncias imprevisíveis e incontroláveis (forte chuva e baixa visibilidade), não sendo possível imputar a ela responsabilidade exclusiva pelos danos alegados. Frisou, ainda, a contribuição do Sr. Flávio para o acidente, pontuando que a manobra repentina realizada pelo autor, ao cortar sua trajetória, dificultou qualquer reação adequada de sua parte, entendendo que Flávio também deve arcar com parte da responsabilidade pelo acidente
Sobreveio sentença de improcedência do pedido, a qual foi proferida nos seguintes termos:
SENTENÇA
Processo Digital nº: 00008987-98.2023.4.5.0031.
Classe – Assunto: Ação de Responsabilidade Civil por Danos Materiais e Morais.
Requerente: Flávio Dutra.
Requerida: Joana Bradiburgo Dumont.
Juiz de Direito: Dr. Cláudio Monteiro de Almeida.
Vistos.
FLÁVIO DUTRA, já qualificado nos autos em epígrafe, ajuizou a presente Ação de Responsabilidade Civil por Danos Materiais e Morais em face de Joana Bradiburgo Dumont, qualificada também nos autos, sob a alegação, em síntese, de que dirigia seu veículo em rua movimentada quando a requerida dirigindo seu carro de forma negligente colidiu violentamente com seu veículo, causandolhe lesões físicas e graves danos morais.
É O RELATÓRIO.
FUNDAMENTO E DECIDO.
Em que pesem as alegações apresentadas pelo requerente, a requerida apontou que as chuvas ocorridas no dia do acidente teriam prejudicado o manejo do veículo, não sendo, desta forma, responsável pelos danos causados.
Não obstante, é imperioso destacar que a requerida é clara ao frisar o cumprimento de sua parte de todas as regras de trânsito.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente Ação de Responsabilidade Civil por Danos Materiais e Morais, ante as alegações da parte requerida, que demonstram que os fatos se deram em razão das fortes chuvas, e não por sua vontade.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o trânsito em julgado desta decisão, arquivem-se os autos.
Flávio ficou inconformado com a sentença proferida, principalmente porque, no dia do acidente, não houve qualquer chuva, sendo um dia ensolarado e, principalmente, porque o magistrado, com certeza, não deve ter tomado ciência da gravação de fls. 729, na qual resta claro que a Sra. Joana, neste dia de sol, fez uma manobra brusca em alta velocidade que contribuiu sobremaneira para o acidente.
Lembramos que as mencionadas provas já constam dos autos, não tendo sido analisadas por um provável lapso do magistrado ou da zelosa serventia e, ainda, que Flávio está desempregado e não possui condições de arcar com os custos da interposição de eventual recurso.
Fundamentando!
Primeiramente, o estudante deve identificar a peça processual necessária à defesa dos interesses da parte prejudicada pelo julgamento desfavorável da ação, observando, desta forma, a espécie de pronunciamento emanado e as razões apresentadas.
O art. 203 do CPC define as espécies de pronunciamento proferidos pelo juiz. Em se tratando das sentenças, essas podem ser proferidas com ou sem o julgamento do mérito. Seu conceito se encontra expresso no art. 203, §1º, do CPC: “Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução” (Brasil, 2015, [s. p.]).
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, ao tratar da sentença, afirmam:
O pronunciamento do juiz só será sentença se a) contiver uma das matérias previstas no CPC 485 ou 487 (CPC 203, § 1º) e, cumulativamente, b) extinguir a fase cognitiva do processo comum ou a execução (CPC 203, § 1º), porque se o pronunciamento de natureza decisória for proferido no curso do processo comum ou de execução, isto é, sem que se lhe coloque termo, deverá ser definido como decisão interlocutória (…). (Nery Junior; Nery, 2016, p. 782)
No art. 485 do Código de Processo Civil, temos as hipóteses de extinção do processo judicial sem a efetiva resolução do mérito, sendo estas enumeradas nos incisos I a X. Por sua vez, o art. 487 trata das hipóteses de extinção do feito com a resolução do mérito.
1. REQUISITOS DA SENTENÇA
Independentemente do conteúdo da sentença, se fundamentado o art. 485 (sem resolução do mérito) ou o art. 487 (com resolução do mérito) do Código de Processo Civil, a sentença a ser proferida deve indispensavelmente observar alguns requisitos fundamentais, possuindo: Relatório, Motivação e Dispositivo.
1.1 RELATÓRIO
Preliminarmente, ao proferir a sentença, o magistrado deve elaborar um relatório, conforme disposição expressa do art. 489 do Código de Processo Civil, contendo os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo.
Com relação ao relatório da sentença, cabe lembrar que este pode ser dispensado nos Juizados Especiais, conforme previsão do art. 38 da Lei Federal nº 9.099/95.
1.2 MOTIVAÇÃO
A necessidade de motivação nos julgamentos proferidos pelos órgãos do Poder Judiciário é obrigação constitucional, prevista no art. 93, IX, da Magna Carta:
IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. (Brasil, 1988, [s. p.])
O Código de Processo Civil, em seu art. 489, §1º, apresenta as hipóteses em que não se considera fundamentada a sentença, acordão ou decisão interlocutória, ipsis litteris:O Código de Processo Civil, em seu art. 489, §1º, apresenta as hipóteses em que não se considera fundamentada a sentença, acordão ou decisão interlocutória, ipsis litteris:
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. (Brasil, 2015, [s. p.])
Assim, conforme previsão constitucional, a sentença ou decisão que for proferida sem a devida motivação é nula de pleno direito.
PONTO DE ATENÇÃO
Frise-se que o STJ admite a elaboração do relatório per relationem, ou seja, o relatório elaborado por referência a outro anteriormente já constante no processo. O relatório per relationem é comumente utilizado em acórdãos, em que se aproveita do relatório da sentença impugnada.
1.3 DISPOSITIVO
O dispositivo é a parte final da sentença. É o texto relativo ao acolhimento ou não da pretensão do autor. Devem ser analisados, no caso concreto, todos os pedidos constantes na exordial e, ainda, aqueles presentes na contestação ou reconvenção.
Caso não sejam devidamente analisados todos os pedidos realizados, estaremos diante de uma sentença citra petita. O julgamento deve ficar vinculado exatamente ao que foi requerido, ou estaremos diante de sentença extra ou ultra petita, a depender do caso.
2. EFEITOS DA SENTENÇA
Por efeito da sentença, entende-se as consequências jurídicas avindas dela, as quais estão estritamente vinculadas ao pedido formulado. Nos processos de conhecimento, há três tipos de tutela: a declaratória, a condenatória e a constitutiva.
2.1 TUTELA DECLARATÓRIA
Quando o pedido do autor for limitado à declaração de determinada situação, estaremos diante de uma tutela declaratória.
O art. 19 do CPC é didático ao prever que o interesse do autor pode limitar-se à declaração da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica. Tal tutela visa afastar uma incerteza, por exemplo, quanto à existência de uma relação jurídica ou à autenticidade de um documento.
As sentenças declaratórias possuem eficácia ex tunc, ou seja, seus efeitos retroagem até a efetiva data da situação declarada.
2.2 TUTELA CONSTITUTIVA
Diferente da tutela declaratória, que se limita a uma simples declaração de uma situação, a tutela constitutiva tem por objeto constituir (ou desconstituir) determinada relação jurídica.
As sentenças de tutela constitutiva, diferente das declaratórias, possuem eficácia ex nunc, produzindo efeitos apenas após seu trânsito em julgado, ou seja, seus efeitos não retroagem.
2.3 TUTELA CONDENATÓRIA
De modo diverso das tutelas já citadas, a tutela condenatória tem o condão de impor ao requerido uma obrigação a ser cumprida.
Ao proferir uma sentença de tutela condenatória, o magistrado, além de declarar que o autor tem razão em sua pretensão, constitui título executivo em seu favor. Caso a parte vencida não cumpra a obrigação consubstanciada no título executivo de modo voluntário, o vencedor pode executar a sua pretensão.
Assim como ocorre com a tutela declaratória, a tutela condenatória possui efeitos ex tunc, retroagindo até a efetiva data de propositura da ação, porém a execução, via de regra, apenas pode ser iniciada com o trânsito em julgado.
3 DOS RECURSOS CABÍVEIS EM FACE DA SENTENÇA
Apenas com a finalidade de recapitular a matéria explanada na Seção 3, lembramos que, em vista de sentença proferida, a parte interessada poderá opor embargos de declaração (no prazo de cinco dias) para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; corrigir erro material; ou ainda, em não havendo qualquer dessas hipóteses, em saindo vencido totalmente ou em partes, o interessado poderá interpor recurso de apelação (no prazo de 15 dias).
Vamos peticionar!
Prezado estudante, face a sentença proferida, é primordial a identificação da parte sucumbente
(prejudicada) e a sua pretensão, identificando a peça adequada à defesa de seus interesses.
Destaca-se que a fundamentação do magistrado afronta dispositivo legal, o que compete ao
estudante atentar-se ao mérito da sentença, encontrando fundamentos aptos para sua impugnação.