Direito Penal

Seção 4

Direito Penal

Sua causa!

Na linha dos fatos, foi ofertada a ação penal na forma seguinte: “Trata-se de denúncia criminal oferecida em razão de o acusado ter praticado os delitos previstos no art. 121, § 2º, II (motivo fútil) e VIII (emprego de arma de fogo de uso restrito), do Código Penal, por duas vezes (duas vítimas), combinado com o crime do art. 16, caput (porte ilegal de arma de fogo de uso restrito), da Lei nº 10.826/03, por duas vezes (fuzil e pistola 9 mm), e art. 33, caput (tráfico de drogas), da Lei nº 11.343/06, todos em concurso material de crimes, na forma do art. 69 do Código Penal. A materialidade dos delitos de porte ilegal de arma de fogo e tráfico de drogas pode ser aferida ao longo do processo, sendo dispensável o exame de corpo de delito nesse momento processual. Quanto ao crime de homicídio, entende-se que ele ocorrera por meio de disparo de arma de fogo, não sendo necessária a sua comprovação pericial. Por fim, quanto ao concurso material de crime previsto no artigo 69, CP, ele deve ser aplicado, pois o princípio da consunção não possui aplicação no presente caso, pois os bens jurídicos tutelados são diversos, pelo que pede o Ministério Público a sua pronúncia em todos os crimes narrados”. 

Na sequência, o réu fora denunciado na forma transcrita anteriormente, tendo a Defesa pugnado pela rejeição da peça acusatória, por ter sido produzida prova ilícita e não ter sido realizado exame pericial nos crimes narrados. Além disso, foi requerido que se aplicasse o princípio da consunção ou absolvição. 

Apesar dessas alegações, o Magistrado decidiu pelo prosseguimento do feito, concordando integralmente com a peça acusatória do Ministério Público, mencionando que os fatos seriam mais bem elucidados por ocasião da instrução processual em audiência específica. 

Em audiência de instrução e julgamento, primeiramente, interrogou-se o acusado, não tendo sido juntado ou ouvido perito oficial sobre a materialidade dos crimes. Em substituição ao exame de corpo de delito, foram ouvidas testemunhas de acusação consistentes em policiais militares que disseram que, pela experiência profissional, as armas apreendidas eram de verdade e tinham capacidade de lesionar pessoas, bem como que a droga apreendida era própria para consumo. Ademais, os policiais militares disseram que adentraram a residência do acusado porque ele era sabidamente criminoso e lá encontraram as provas dos crimes. Foi ouvida uma testemunha de defesa que afirmou ter visto da janela de sua residência os policiais militares chutando a porta e invadindo a casa do acusado, bem como ouviu ele ser espancado e torturado, em razão dos gritos e pedidos de clemência por parte dos militares. 

Após a produção dessas provas em audiência de instrução, foi aberta vista para a Acusação e a Defesa apresentarem as suas considerações finais no prazo de 5 (cinco) dias. O Ministério Público ofertou suas considerações, requerendo a pronúncia na forma proposta pela denúncia criminal. 

Logo, o processo está com vista para a Defesa apresentar a peça cabível nesse momento processual, sendo que a intimação ocorrera em 24/11/23, sexta-feira. Considere o último dia para a interposição do instrumento processual adequado.

Fundamentando!

DAS PROVAS 

A audiência de instrução e julgamento é o momento processual adequado para fazer valer os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, pois todos os personagens processuais participam de forma a produzir as provas que serão utilizadas para que seja proferida a sentença. Tal assertiva é importante para fazer valer o dispositivo previsto no art. 155 do CPP nestes termos:

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Por isso, imprescindível a prova ser reproduzida em juízo para que possa ser utilizada pelo Poder Judiciário para a prolação de uma sentença criminal. 

No que diz respeito ao interrogatório como meio de prova, menciona-se que o Código de Processo Penal assinala que o acusado poderá apresentar a sua versão dos fatos ou calar-se, devendo ser ouvido ao final, em obediência ao princípio constitucional da ampla defesa. Essa é a dicção do Código de Processo Penal, in verbis:

Art. 186, CPP. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.
Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.

Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos.
§ 1º Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.
§ 2º Na segunda parte será perguntado sobre:
I – ser verdadeira a acusação que lhe é feita;
II – não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuíla, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;
 III – onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;
IV – as provas já apuradas;
V – se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas;
VI – se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;
VII – todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;
VIII – se tem algo mais a alegar em sua defesa.

Art. 411. Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate.

Diante dos dispositivos citados, especialmente o art. 411 do CPP, que regulamenta a audiência de instrução e julgamento, percebe-se que o interrogatório deve ser feito ao final, em homenagem aos princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e devido processo legal.

Por tratar-se de uma imposição constitucional (devido processo legal), a inversão do rito processual do interrogatório, sendo feito ao início da audiência de instrução e julgamento, gerará uma nulidade, ferindo de morte a possibilidade de contraditório, bem como espanca a ampla defesa.

Essa é a visão serena na jurisprudência pátria, citando-se, por todos, acórdão do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL PENAL. TEMA 1.114. INVERSÃO DA ORDEM NO INTERROGATÓRIO DO RÉU. ART. 400 DO CPP. NULIDADE QUE SE SUJEITA À PRECLUSÃO TEMPORAL. ART. 571, INCISO II E ART. 572, AMBOS DO CPP E À DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO À DEFESA – ART. 563 DO CPP. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NESTA EXTENSÃO PROVIDO. 

I – Em que pese haver entendimento nesta Corte Superior admitindo o interrogatório quando pendente de cumprimento carta precatória expedida para oitiva de testemunhas e da vítima, a jurisprudência majoritária nas Cortes superiores vem evoluindo e se sedimentando no sentido de que há nulidade ocasionada pela inversão da ordem prevista no art. 400 do CPP, no entanto, a alegação está sujeita à preclusão e à demonstração do efetivo prejuízo. 
II – Os parâmetros em aparente oposição são, portanto, o artigo 222, § 1°, do CPP e o art. 400 do mesmo diploma legal. Ao que se pode enfeixar a controvérsia, colocase em ponderação os princípios da celeridade processual e do devido processo legal, especialmente na sua dimensão da ampla defesa.
III – A audiência de instrução e julgamento é o principal ato do processo, momento no qual se produzirão as provas, sejam elas testemunhais, periciais ou documentais, ao fim da qual, a decisão será proferida. Por esta razão, o art. 400 determina que a oitiva da vítima, das testemunhas arroladas pela acusação e depois pela defesa, nesta ordem, eventuais esclarecimentos de peritos, acareações, ou reconhecimento de coisas ou pessoas e, por fim, o interrogatório. Tal artigo, introduzido no ordenamento pela Lei n. 11.719, de 2008, significou a consagração e maximização do devido processo legal, notadamente na dimensão da ampla defesa e do contraditório, ao deslocar o interrogatório para o final da instrução probatória.
IV – Na moderna concepção do contraditório, segundo a qual, a defesa deve influenciar a decisão judicial, somente se mostra possível a referida influência quando a resposta da defesa se embasar no conhecimento pleno das provas produzidas pela acusação. Somente assim se pode afirmar a observância ao devido processo legal na sua face do contraditório.
V – Sob outro enfoque, ao réu incumbe arguir a nulidade na própria audiência ou no primeiro momento oportuno, salvo situação extraordinária em que deverá argumentar a excepcionalidade no primeiro momento em que tiver conhecimento da inversão da ordem em questão. Cabe também à defesa a demonstração do prejuízo concreto sofrido pelo réu, uma vez que se extrai do ordenamento, a regra geral segundo a qual, as nulidades devem ser apontadas tão logo se tome conhecimento delas, ou no momento legalmente previsto, sob pena de preclusão, tal como dispõe o art. 572 e incisos, do CPP.
VI – No caso concreto, observa-se que o primeiro momento em que a defesa apontou a nulidade pela violação do art. 400 do CPP foi em razões de apelação. Isso porque, ao que se observa nos autos, não é difícil notar a insuficiência da defesa exercida por advogado dativo. As nomeações de advogados dativos para o ato de interrogatório, bem como para a apresentação de defesa prévia e alegações finais (cujos termos são idênticos, conforme fls. 170/172 e 256/258, respectivamente) parecem não ter suprido minimamente o direito à defesa enunciado pela Constituição da República.
VII – Em sendo assim, é possível se reconhecer que, no primeiro momento em que o réu estava sendo representado por um advogado, foi arguida a nulidade. Esta deve ser reconhecida, notadamente nesta hipótese em exame, em que a prova é exclusivamente oral, uma vez que os Laudo de Exame de Conjunção Carnal e de Exame de Ato Libidinoso não corroboram os fatos e tampouco o Relatório Psicológico é categórico sobre a veracidade da versão narrada pela vítima. Por tal razão, deve ser reconhecida a nulidade arguida, determinando-se que o réu seja novamente ouvido, em atenção ao art. 400, do CPP.
VIII – Tese jurídica: “O interrogatório do réu é o último ato da instrução criminal. A inversão da ordem prevista no art. 400 do CPP tangencia somente à oitiva das testemunhas e não ao interrogatório.
O eventual reconhecimento da nulidade se sujeita à preclusão, na forma do art. 571, I e II, do CPP, e à demonstração do prejuízo para o réu”.
Recurso parcialmente conhecido e nesta extensão provido para reconhecer a nulidade do interrogatório que, realizado antes da oitiva das testemunhas, violou a norma do art. 400 do CPP, razão pela qual os autos devem ser devolvidos para a realização de novo interrogatório. Prejudicados os demais pedidos recursais relativamente à ausência de prova da autoria delitiva. (REsp 1933759 / PR).

De acordo com essa jurisprudência, a inversão do interrogatório para o início da audiência de instrução e julgamento gera uma hipótese de nulidade, devendo o ato ser anulado desde o início da referida audiência, na forma do art. 564, IV, do CPP.

Em relação à prova testemunhal, na forma dos arts. 202 e 203 do CPP, destaca-se que a pessoa que presenciou os fatos tem o dever legal de dizer a verdade, podendo qualquer um ser considerado testemunha na forma prescrita na lei:

Art. 202. Toda pessoa poderá ser testemunha. Art. 203. 

A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado, devendo declarar seu nome, sua idade, seu estado e sua residência, sua profissão, lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma das partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade.

As testemunhas são ouvidas acerca dos fatos e possuem o dever de falar a verdade sobre o que presenciaram, não podendo deixar de comparecer ao referido ato processual. Pela ordem processual já citada, primeiro, são ouvidas as testemunhas de acusação e, posteriormente, as de defesa, em obediência, mais uma vez, aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. 

Os policiais militares podem ser ouvidos como testemunhas, uma vez que é natural do seu ofício presenciarem a prática de crimes, todavia esse meio de prova não pode ser considerado absoluto, como se todos os agentes públicos que participaram da prisão fossem pessoas de presumida boafé, devendo essa análise ser feita no caso concreto, conforme jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, nesses termos: 

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO IMPUGNADOS. SÚMULA 182/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. CONDENAÇÃO POR TRÁFICO DE DROGAS E POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA CASSADA PELO TRIBUNAL A QUO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. FLAGRANTE ILEGALIDADE. CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO. 

1. É inviável o agravo regimental que não infirma os fundamentos da decisão atacada. Incidência da Súmula n. 182 do STJ.
2. Todavia, diante da ilegalidade do acórdão no que tange à condenação do réu, impõe-se a concessão da ordem, ex officio, para restabelecer a sentença absolutória.
3. O entendimento firmado nesta Corte Superior é o de que “a revaloração dos elementos fático-probatórios delineados pelas instâncias ordinárias não encontra óbice na Súmula n. 7/STJ.” (AgRg no REsp 1.678.599/MG, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 7/11/2017, DJe 14/11/2017).
4. Conforme constou na sentença absolutória, de forma detalhada, não foi produzida nenhuma prova robusta no sentido de que o réu, efetivamente, estaria exercendo o tráfico de drogas, a não ser pelos depoimentos judiciais dos agentes policiais que efetuaram a prisão em flagrante, considerados imprecisos pelo magistrado de 1º grau, e que não foram adequadamente ponderados no acórdão recorrido, não havendo, portanto, elementos seguros para fundamentar a condenação.
5. Como se depreende dos autos, os policiais receberam denúncias anônimas acerca da ocorrência de tráfico de drogas, o que teria sido confirmado por meio de “colaboradores anônimos da polícia”. Ocorre que, na residência do réu (primário e de bons antecedentes), fora encontrada pequena quantidade de entorpecentes – 5,1 g de cocaína e 3 g de maconha – além de 3 munições, tendo o agravante afirmado que seria apenas usuário de drogas.
6. Com efeito, “O testemunho prestado em juízo pelo policial deve ser valorado, assim como acontece com a prova testemunhal em geral, conforme critérios de coerência interna, coerência externa e sintonia com as demais provas dos autos, não atendidos na hipótese. Inteligência dos arts. 155 e 202 do CPP” (AREsp n. 1.936.393/RJ, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 8/11/2022.).
7. Assim, em consonância com o princípio in dubio pro reo, oriundo do art. 5º, em vários dos seus incisos, da Constituição da República deve ser restabelecida a sentença absolutória, com amparo no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. 
8. Desse modo, não estando configurada a prática do crime de tráfico de entorpecentes, imperioso o reconhecimento da atipicidade material da conduta, relativa à posse de 03 munições de uso restrito, desacompanhadas do armamento capaz de deflagrá-las, tendo em vista a ausência de lesão ou probabilidade de lesão ao bem jurídico tutelado.
9. Agravo regimental desprovido. Concessão de habeas corpus, de ofício, para cassar o acórdão recorrido, restabelecendo-se a sentença que absolveu o recorrente da prática dos delitos previstos no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 e no art. 16, caput, da Lei n. 10.826/2003 (Processo n. 0006985-95.2016.8.21.0023).

Além disso, em situações de comprovada prática de crimes para obtenção das provas produzidas em violação à legislação processual, ilicitude da prova é algo que se impõe e deve ser levada em consideração para fins de julgamento, o que cai por terra a ideia da presunção de legitimidade dos depoimentos prestados por policiais militares. Esta é a redação do art. 157 do CPP:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. § 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.

A ilicitude das provas pode ser visualizada quando há a prática de um crime para fins de produção de prova contra alguém, como pode acontecer nos crimes de tortura e abuso de autoridade, a seguir mencionados:

Lei nº 9.455/97 

Art. 1º Constitui crime de tortura:
I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena – reclusão, de dois a oito anos.

Lei nº 13.869/19

Art. 22. Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei: 

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Em especial no crime de invasão de domicílio sem o consentimento do morador, mencionado na Lei nº 13.869/19, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o militar deve registrar, com vídeo e áudio, o aludido consentimento, sob pena de a prova obtida por esse meio não ter validade, nesses termos:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL.TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. BUSCA DOMICILIAR EFETUADA POR POLICIAIS MILITARES SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. FUNDADAS RAZÕES PARA REALIZAÇÃO DA BUSCA. INVERSÃO DA ORDEM DO INTERROGATÓRIO. ART. 400 DO CPP. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus. (AgRg no HC 437.522/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe 15/06/2018).
2. O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral, que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE n. 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes) DJe 8/10/2010). Nessa linha de raciocínio, o ingresso em moradia alheia depende, para sua validade e sua regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. Precedentes desta Corte. 
3. Em recente decisão, a Colenda Sexta Turma deste Tribunal proclamou, nos autos do HC 598.051, da relatoria do Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sessão de 02/03/2021 (….) que os agentes policiais, caso precisem entrar em uma residência para investigar a ocorrência de crime e não tenham mandado judicial, devem registrar a autorização do morador em vídeo e áudio, como forma de não deixar dúvidas sobre o seu consentimento. A permissão para o ingresso dos policiais no imóvel também deve ser registrada, sempre que possível, por escrito. 

4. No caso concreto, a leitura do auto de prisão em flagrante revela que os Policiais Militares que efetuaram a busca domiciliar, atuaram após terem presenciado o paciente entregar algo para um menor que, ao ver a guarnição, arremessou uma sacola o que motivou a realização da abordagem de ambos e a verificação do conteúdo da sacola, ocasião em que se constatou que ela continha um pedaço de substância similar a crack, tendo os policiais logrado identificar o paciente como indivíduo que fora preso recentemente por porte ilegal de arma de fogo além de porte de entorpecentes.
5. A constatação, em abordagem policial, de que o réu entregava entorpecentes a menor constitui fundada razão para crer que na residência do acusado houvesse se não outras drogas, pelo menos outras evidências do tráfico, tanto mais quando a tal constatação se alia a informação de que o mesmo acusado fora detido dias antes com entorpecentes e uma arma de fogo.
6. Por ocasião do julgamento do HC n. 127.900/AM, ocorrido em 3/3/2016 (DJe 3/8/2016), o Pleno do Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que o rito processual para o interrogatório, previsto no art. 400 do Código de Processo Penal, deve ser aplicado a todos os procedimentos regidos por leis especiais. Isso porque a Lei n. 11.719/2008 (que deu nova redação ao referido art. 400) prepondera sobre as disposições em sentido contrário previstas em legislação especial, por se tratar de lei posterior mais benéfica ao acusado.
7. Isso não obstante, esta Corte Superior já consolidou entendimento no sentido de que, para se reconhecer nulidade pela inversão da ordem de interrogatório, “é necessário que o inconformismo da Defesa tenha sido manifestado tempestivamente, ou seja, na própria audiência em que realizado o ato, sob pena de preclusão. Além disso, necessária a comprovação do prejuízo que o réu teria sofrido com a citada inversão” (HC 446.528/SP, Rel. p/ acórdão Ministro FELIX FISCHER, j. 11/9/2018, DJe 20/9/2018). Precedentes: RvCr 5.563/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 12/05/2021, DJe 21/05/2021; AgRg no REsp 1.846.930/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 16/03/2021, DJe 19/03/2021.
8. Não se identifica prejuízo derivado da realização de interrogatório antes da oitiva das testemunhas de acusação se a leitura da sentença revela que, em sua oitiva, o réu teve oportunidade de apresentar sua versão dos fatos, devidamente analisada pelo magistrado, e que os depoimentos prestados por policiais em juízo apenas referendaram narrativa já existente no Boletim de ocorrência e no Relatório final de inquérito policial, documentos esses aos quais a defesa teve acesso antes do interrogatório, não se podendo, assim, afirmar que o réu não teria tido oportunidade de refutar, em seu interrogatório, as versões apresentadas pelos policiais ouvidos em juízo.
9. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 2022620 / AC)

No mesmo sentido narrado, a prova obtida pelos militares sem que tenha havido o consentimento do morador para ingressar em seu domicílio macula de nulidade o processo penal, não podendo ser levada em consideração por parte do Poder Judiciário, nesses termos:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (140 G DE MACONHA E 19,5 G DE COCAÍNA). NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. DENÚNCIA ANÔNIMA. MANIFESTA ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. CARÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, BEM COMO DE CONSENTIMENTO VÁLIDO DO MORADOR. MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. 

1. Na exordial acusatória consta que a Polícia Federal várias vezes obteve informação de que o denunciado Valdo Lima da Silva vendia drogas em sua casa. No dia dos fatos, após receberem denúncia anônima de que o denunciado estava vendendo cocaína, policiais federais o abordaram em frente à sua residência e encontraram com ele a quantia de R$ 1.172,00, fracionados em 87 cédulas, bem como, passaram a fazer buscas no quintal e interior da casa, encontrando 16,29 g de pasta-base de cocaína e 4,25 g de cocaína envolvidas em pequenos invólucros plásticos (fl. 60).
2. Extraem-se do combatido aresto razões colacionadas para a condenação do agravado: a prova obtida na casa onde ocorria a prática de crime permanente – tráfico de drogas – é lícita, pois coloca o agente em constante estado de flagrância, afastando assim a necessidade de mandado judicial para uma eventual ação policial, conforme disposto no artigo 302, inciso I, do Código de Processo Penal. […] Aliado a isso, verifico que na fase inquisitória o sobrinho da ex- companheira do apelante – José Emerson Lima da Silva -, declarou que se encontrava na residência no momento da chegada dos policiais e franqueou a entrada dos mesmos. […] Assim, tratando-se de crime permanente, hipótese dos autos, não é necessária a expedição de mandado de busca e apreensão, sendo lícito à autoridade policial ingressar no interior do domicílio. Portanto, não há ilegalidade na diligência realizada no domicílio da excompanheira do apelante (fls. 221/223).
3. Consoante entendimento do Supremo Tribunal Federal, a notícia anônima de crime, por si só, não é apta para instaurar inquérito policial; ela pode servir de base válida à investigação e à persecução criminal, desde que haja prévia verificação de sua credibilidade em apurações preliminares, ou seja, desde que haja investigações prévias para verificar a verossimilhança da noticia criminis anônima. Assim, com muito mais razão, não há como se admitir que denúncia anônima seja elemento válido para violar franquias constitucionais (à liberdade, ao domicílio, à intimidade).
4. […] a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que “[…] a prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudiovídeo e preservada tal prova enquanto durar o processo […]” (HC n. 608.405/PE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 6/4/2021, DJe 14/4/2021). […] Como não ficou devidamente comprovada a legalidade do acesso direto dos agentes policiais na residência do Acusado, não há outro caminho senão reconhecer a nulidade das provas obtidas por este meio de prova. […] Tal nulidade, ocorrida ainda no início da fase investigatória, contaminou todas as demais provas produzidas, que são delas derivadas, impondo-se a anulação integral do processo e absolvição do Agravado, nos termos do art. 386, inciso II, do Código de Processo Penal, pela ausência de provas válidas da existência do fato. (AgRg no AREsp n. 1.842.493/AM, Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 31/8/2022). 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 2022620 / AC)

O que se percebe pela jurisprudência citada é que a prova é eivada de nulidade, desde a fase investigatória, contaminando todas as provas produzidas posteriormente, na forma do art. 157, § 1º, do CPP, in verbis:

Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.

§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.

Caso não tenha nenhuma outra prova hábil a condenar o acusado, a impronúncia é medida que se impõe, na forma do art. 414 do CPP. 

Quanto à prova pericial, trata-se de meio admitido também no Código de Processo Penal, devendo ser bem observado que há uma certa taxatividade para a sua realização nos crimes que deixam vestígios (delitos não transeuntes), não sendo possível outro meio substitutivo de prova, o que torna imprescindível a sua realização, nesses termos: “Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”. 

Os crimes de homicídio, porte ou posse de arma de fogo e tráfico de drogas necessitam de exame pericial, pois são delitos que deixam vestígios e necessitam de ter a materialidade atestada. O suprimento do exame pericial, no crime de homicídio, pode até ser feito por outros meios de prova lícitos, o que não ocorre quando policiais militares praticaram delitos (tortura e abuso de autoridade) para a obtenção de provas contra o acusado, na forma da jurisprudência mencionada a seguir:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PROVA INDIRETA DA MATERIALIDADE DOS DELITOS. ARTS. 158 E 167 DO CPP. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 41 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA. DESCONSTITUIÇÃO DO LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A ausência de exame de corpo de delito no crime de homicídio não constitui, necessariamente, nulidade, podendo a prova da materialidade da conduta ser suprida, tanto de forma direta quanto indireta, com base no conjunto probatório, o que atende aos pressupostos do art. 41 do CPP.

2. A desconstituição da formação do livre convencimento motivado a respeito da presença da justa causa para ação penal, em especial quanto aos indícios de autoria e materialidade apresentados pelo órgão ministerial no momento do oferecimento da denúncia, demanda necessária dilação probatória, procedimento vedado na estreita via do habeas corpus.
3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 661479 / PA).

Na mesma linha de pensamento, os crimes de posse ou porte de arma de fogo e tráfico de drogas necessitam de perícia para fins de ter validade a prova produzida, conforme se depreende do conteúdo do Superior Tribunal de Justiça mencionado a seguir, nesses termos:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL DA DROGA APREENDIDA. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE DELITIVA. ALTERAÇÃO DO JULGADO. INVIABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A jurisprudência do STJ estabelece que, para a condenação por tráfico de drogas, é necessário comprovar a materialidade do delito com a apreensão da droga e a elaboração de laudo pericial. A ausência desse laudo impossibilita a comprovação da materialidade e resulta na absolvição do réu por falta de provas (HC n. 686.312/MS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, relator para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 19/4/2023).
2. Destaca-se que a apreensão da droga pode ocorrer com o acusado ou qualquer um dos corréus, desde que demonstre a sua ligação com a organização criminosa. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ reconhece que a falta de apreensão direta com o agente não afasta a materialidade do tráfico quando há evidências da sua relação com outros membros da organização criminosa responsáveis pela guarda das drogas (HC n. 536.222/SC, Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 4/8/2020).
3. No presente caso, constatou-se a realização de perícia nas drogas apreendidas, mesmo que relacionadas aos corréus, o que invalida a alegação absolutória pretendida. A alteração do julgado demandaria um indevido reexame do conjunto fático-probatório, o que não é permitido nessa via estreita.
4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 812752 / PE)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. ARTS. 12 E 16 DA LEI N. 10.826/2006. TRANCAMENTO DA PERSECUÇÃO PENAL. ALEGADA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA POR OBSOLESCÊNCIA DOS ARTEFATOS APREENDIDOS. INOCORRÊNCIA. POTENCIALIDADE LESIVA ATESTADA POR LAUDOS PERICIAIS. DELITOS DE PERIGO ABSTRATO QUE PRESCINDEM DE EFETIVO RISCO À PAZ PÚBLICA. PRECEDENTES. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL EM HABEAS CORPUS É MEDIDA EXCEPCIONAL. NECESSIDADE DE ANÁLISE APROFUNDADA DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE NA VIA PROCESSUAL ELEITA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

– Consolidou-se, nesta Superior Corte de Justiça, entendimento no sentido de que somente é cabível o trancamento da persecução penal por meio do habeas corpus quando houver comprovação, de plano, da ausência de justa causa, seja em razão da atipicidade da conduta praticada pelo acusado, seja pela ausência de indícios de autoria e materialidade delitiva, ou, ainda, pela incidência de causa de extinção da punibilidade. Precedentes.
– Havendo a potencialidade lesiva da arma de fogo e das munições sido atestadas pelos laudos periciais, não há que se falar em ausência de justa causa para o prosseguimento da persecução penal, pois se tratam de delitos de perigo abstrato, os quais prescindem de efetivo risco à paz pública. Por tais razões, a Quinta Turma desta Corte consolidou o entendimento segundo o qual o porte de munição, ou mesmo de arma de fogo desmuniciada, subsumem-se aos tipos penais previstos na Lei n. 10.826/2006. Precedentes.
– Desse modo, não sendo possível atestar de plano a atipicidade das condutas atribuídas ao paciente, impossível concluir-se pela inexistência de justa causa para a persecução criminal, pois, para se negar a ocorrência dos fatos delituosos, seria necessária a análise aprofundada de matéria fático-probatória, o que é vedado na via estreita do habeas corpus.
– Agravo regimental não provido. (AgRg no HC 741264 / SP).

Os demais pormenores da prova pericial estão tratados nos arts. 159 e 160, in verbis:

Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior.
§ 1º Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame.
§ 2º Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo.
§ 3º Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de assistente técnico.
§ 4º O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão.
§ 5º Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à perícia: 
I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar;
II – indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência.
§ 6º Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base à perícia será disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossível a sua conservação.
§ 7º Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico.

Art. 160. Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que examinarem, e responderão aos quesitos formulados. Parágrafo único. O laudo pericial será elaborado no prazo máximo de 10 dias, podendo este prazo ser prorrogado, em casos excepcionais, a requerimento dos peritos.

Importante destacar que a ausência do exame de corpo de delito é, inclusive, caso de nulidade processual, conforme se destaca do art. 564, III, b), do CPP, nesses termos:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
(…)
III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
(…)
b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167;

Dessa forma, como não há prova lícita ou válida para a condenação, importante mencionar o disposto no art. 414 do CPP, que determina a impronúncia em tais situações. 

DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO E ERRO NA EXECUÇÃO 

O princípio da consunção ou absorção impõe que o acusado deve responder apenas por um crime, qual seja, o crime-fim, restando absorvido o crime-meio necessário para chegar-se ao delito final. Por exemplo, caso alguém se valha de uma arma de fogo para realizar um crime de homicídio, os crimes de posse e porte de arma de fogo anteriormente praticados para a consecução daquele crime devem ser absorvidos, diferentemente do que ocorre no concurso material de crimes, previsto no art. 69 do CP, em que todos os crimes são aplicados e as respectivas penas somadas.

Em outras palavras, em vez de o agente responder por vários crimes com as penas somadas, haverá a punição apenas pelo crime-fim, restando os demais crimes absorvidos e sem qualquer punição. 

Além disso, deve ser lembrado que, no presente caso, ocorreu a hipótese de erro na execução prevista no art. 73 do CP, que tem a seguinte redação:

Erro na execução 

Art. 73 – Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.

Quando o agente queria atingir apenas uma pessoa, mas atinge ambas, tem-se a regra do art. 70 do CP, que é citada na parte final do art. 73. Por tal regra, ocorre aquilo que se chama de concurso formal próprio, em que o agente responde apenas pelo crime mais grave com a pena exasperada, sem que haja a soma delas. Por exemplo, se cometeu um homicídio que almejava e a outra morte não foi desejada, responderá por um crime de homicídio com a pena aumentada, em vez de somar dois homicídios. 

Essa é a dicção do art. 70, 1ª parte, do CP, nesses termos:

Art. 70 – Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. 

Parágrafo único – Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código.

Caso o agente quisesse os dois homicídios, então teria o concurso formal impróprio da 2ª parte do art. 70 do CP, em que as penas seriam somadas, mas isso somente se houvesse dolo de matar as duas vítimas. 

Quanto aos prazos processuais penais, cita-se o Código de Processo Penal com a orientação de excluir-se o dia do início (intimação, por exemplo) e incluir o dia final, lembrando que prazos processuais penais não se iniciam em dias não úteis e não se encerram nesses mesmos dias, na forma do disposto a seguir:

Art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado. 
§ 1º Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento.
§ 2º A terminação dos prazos será certificada nos autos pelo escrivão; será, porém, considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do dia em que começou a correr.
§ 3º O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato.

Logo, deve ser dada atenção à contagem dos prazos processuais, em que o início se dará em dia útil e o dia final também. 

Um detalhe final é que, nos crimes dolosos contra a vida, como ocorre com o homicídio, a competência para julgar todos os delitos conexos é do Tribunal do Júri, daí sendo relevante direcionar a peça processual para esse juízo específico, na forma do art. 78, I, do CPP. 

PONTO DE ATENÇÃO

A produção de prova em audiência de instrução e julgamento é de fundamental importância, pois o destino do acusado é selado nesse relevante momento processual, o que demanda uma atenção especial para a temática das provas no Processo Penal.

Para elaborarmos uma peça prático-profissional, precisamos responder às seguintes indagações:
   1. Após a audiência de instrução e julgamento, qual peça é cabível para manifestar a vontade do acusado? Alegações finais orais, mas que podem ser apresentadas em forma de memoriais escritos.

    2. Houve a correta aplicação do rito processual penal? Se não, o estudante deve ficar atento para pedir o reconhecimento de nulidades em preliminares.

    3. Há possibilidade de pedir mais de uma tese defensiva? Se sim, colocar tudo que interessa à defesa do acusado, pois esse é o último momento processual antes da sentença.

Respondidas essas perguntas, poderemos começar a desenvolver a nossa peça.

  • Sempre importante fundamentar, inicialmente, com algum artigo da Constituição Federal, notadamente o art. 5º. Após a utilização de um artigo da Constituição Federal, é interessante que se utilize um ou mais artigos da legislação infraconstitucional e evidentemente explique o motivo da citação legal. 

   • Precisamos utilizar também a doutrina, se possível, mais de um doutrinador com o mesmo entendimento. A utilização de uma doutrina atual enriquece qualquer peça. 

     • Não podemos deixar de utilizar uma jurisprudência atual acerca do assunto debatido. Devese preferir jurisprudência de Tribunais superiores, como Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Atenção: jurisprudência são decisões reiteradas dos Tribunais, decisões isoladas devem ser evitadas. 

    • Se possível, utilizar súmulas, vinculantes e/ou não vinculantes. 

A primeira coisa a se fazer em uma peça processual é o endereçamento, ou seja, precisamos saber de quem é a competência para analisar aquele fato. Por esse motivo, antes de ajuizar uma ação ou apresentar qualquer peça processual, é necessário que o estudante conheça as regras de competência. As questões da OAB sempre demonstram onde se deu o fato, o que fica claro de atestar a competência. 

Após o endereçamento, precisamos realizar um preâmbulo, no qual colocaremos todos os dados das partes. Nunca se deve inventar dados nas peças práticas da OAB, pois isso identifica a sua prova, o que o desclassificará. 

Em seguida ao preâmbulo, iniciaremos os fatos, que nada mais são que a história contada pelo examinador. 

Depois da narrativa dos fatos, iniciaremos os fundamentos jurídicos. É nesse ponto que você demonstra seu conhecimento. Portanto, faça com muita atenção e demonstre para o seu examinador que você conhece do assunto. 

Após a fundamentação, é hora de fazer os pedidos. Cuidado! Você só pode pedir o que fundamentou. 

Essas são as chamadas “dicas de ouro”. Tenho certeza de que com esse roteiro mental será fácil compreender e colocar em prática todos os seus poderes para uma escorreita peça práticoprofissional. Vamos peticionar?